Novo rumo para a política europeia

Novo rumo para a política europeia

Em 13 de junho, líderes nas áreas de economia e finanças da União Europeia e dos Estados Unidos, incluindo o Ministro das Finanças alemão Wolfgang Schäuble, encontraram-se em Berlim para o G20 Day, evento que antecede a reunião de cúpula do G20 programada para os dias 7 e 8 de julho deste ano em Hamburgo.

Foram debatidos ao longo do dia alguns dos temas que farão parte da agenda do encontro de julho tais como a construção de um sistema financeiro mais resiliente, o impacto das novas tecnologias na área de finanças e políticas de combate as mudanças climáticas. Contudo, foi o atual cenário político europeu que ganhou destaque, sobretudo na fala do ministro alemão. Antes ameaçado pela ascensão de partidos de extrema-direita, pelo Brexit, e pelo impacto da eleição de Donald Trump, o projeto de integração europeu parece ter ganhado novo fôlego. Schäuble, bem como os panelistas que o antecederam, foram enfáticos na defesa de uma maior integração europeia como resposta para os desafios que o bloco vem enfrentando desde a crise de 2008.

Entre os eventos que motivaram essa mudança de postura, a eleição de Emmanuel Macron merece destaque. O novo presidente francês vem se mostrando favorável ao aprofundamento da integração europeia sobretudo nas áreas fiscal e de defesa, projetos também apoiados pelo governo da chanceler Angela Merkel, que, por sua vez, também vem adotando uma postura mais enfática em relação ao papel da União Europeia na manutenção da ordem internacional.

Em comício na Baviera, a chanceler alemã afirmou que os europeus “devem tomar seu destino nas próprias mãos” e que “o tempo em que a Europa podia contar completamente com seus aliados havia, de certa forma, ficado para trás”. Apesar de não o citar nominalmente, o discurso de Merkel faz clara referência a performance desastrosa de Donald Trump nas reuniões de cúpula do G7 e da OTAN em abril. Para além de criar entraves aos debates sobre a implementação do Acordo de Paris, e posteriormente retirar-se do acordo, Trump se negou a endossar o artigo 5º do Tratado do Atlântico Norte criando uma atmosfera de incerteza em relação ao comprometimento dos EUA com a aliança atlântica.

O presidente estadunidense também foi tema nos debates da última terça. Ao ser questionado sobre o futuro da parceria entre a União Europeia e os Estados Unidos, Schäuble afirmou que os EUA continuarão a ser um importante parceiro da UE, no entanto, a Europa continuará trabalhando, agora de forma independente, em áreas como o combate as mudanças climáticas.

Para além da eleição de Macron e do isolacionismo de Trump, a incerteza em relação a forma como se dará a saída do Reino Unido da União Europeia também contribuiu para a mudança de postura dos líderes europeus em relação ao futuro da UE. Os negociadores britânicos que, ao que indicam as declarações da primeira-ministra Theresa May, se preparavam para um “hard Brexit”, saída irrestrita do Reino Unido do mercado comum europeu, agora trabalham para reformular sua estratégia de negociação após o revés sofrido pela primeira-ministra que perdeu sua maioria no parlamento em eleições convocadas por ela mesma em abril.

A incerteza em relação ao Brexit foi tema recorrente no evento em Berlim. Apesar do cenário atual apontar para um “soft Brexit”, em que o Reino Unido teria acesso ao mercado comum, porém sem representação nas instituições europeias e possivelmente seria forçado a aceitar a livre circulação de pessoas, bens, serviços e capital, a fala de Schäuble parece indicar que a estratégia da UE não sofreu alterações e que o bloco continuará se preparando para o pior cenário. Isso inclui tomar medidas preventivas para reduzir o impacto da saída do Reino Unido no sistema bancário e financeiro do bloco. O ministro, contudo, não deu maiores detalhes sobre quais seriam essas medidas.

Apesar do tom diplomático, as considerações de Schäuble durante o G20 Day em Berlim deixam claro a mudança de tom do discurso alemão. Fortalecida pelo apoio de Macron, Merkel enxergou no contexto adverso uma oportunidade, ou talvez a necessidade, de fortalecer a União Europeia e a posição de liderança do bloco na manutenção da ordem internacional. Caberá agora ao povo alemão decidir nas eleições de setembro se subscreve ou não a visão da chanceler alemã.

 

*Artigo publicado originalmente na edição impressa do jornal Correio Braziliense (26/06/2017)

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